sábado, 10 de abril de 2010

Sobre as pessoas e os livros.

Gosto de abrir livro antigo, do cheiro, do mofo. Cheiro de história impregnada em páginas com letras apagadas. Cheiro de papel vencido do século passado. E de pensar que somos livro antigo, fechado. Livro imerso numa vontade infeliz de ser aberto, de ter suas páginas acariciadas pelos dedos novos, com a ânsia de uma nova história a ser escrita. Aquela vontade de suavemente oscilar entre cada espaço como num folhear delicado, se debruçando contra o vento e se pondo ao fim de uma página e o início de outra. Por mais trancafiados em nossos próprios devaneios, nós na condição de livro, queremos ser lidos, estudados e questionados com o carinho em que se leva ao seio esquerdo um Baudelaire, uma Lispector. E enquanto um livro dá em troca o seu conhecimento, damos em troca o nosso afeto. A-F-E-T-O é palavra. E a palavra ainda há de ser um bem tão precioso quanto medieval. Ainda há de ser o presente do amor ao amanhecer e o carinho da despedida. Ah, a palavra: somos livros, somos feitos de palavras e de todos os valores inerentes a elas. E ainda que se viva sozinho conhecendo as palavras e precisando de apenas um punho para escrevê-las, é preciso de outras almas para dar-lhes sentido, é preciso de outros dedos afagando a página velha e dando vida a uma palavra que aprendi assim que adentrei a vida: emoção. Saber do “a”, do “m”, do “o” e do “r” é matéria fácil. Difícil mesmo é juntar as letras e saber do “amor”. Aprendi com as sopas de letrinha; cuidado de mãe. Aprendi com as mãos já calejadas; carinho de pai. Aprendi com o beijo sem pressa medida; afago da paixão. E ainda que no mundo fosse só, inventaria outras mãos para dar razão aos motivos de hoje. Preciso de papel, caneta e de mais alguém ansiando pela escrita de um novo capítulo. Alguém que leu minha história de ontem, segurou meus punhos hoje e ajudará na escrita do amanhã.

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